quarta-feira, 27 de maio de 2009

Cinema Paradiso

A primeira lembrança que tenho do meu contato com o cinema são as filas quilométricas que se formavam no bilheteria toda vez que era anunciado um filme novo d’Os Trapalhões. Isso acontecia a cada seis meses, era um momento para lá de esperado por todas as crianças da época. Com a adolescência meu gosto começou a ficar mais diversificado. Nessa época apenas meu primo possuía vídeo-cassete, portanto as primeiras coisas que conheço estão ligadas mais ao gosto dele do que exatamente às minhas escolhas. Anos passaram até que eu conseguisse convencer o meu pai da importância daquele aparelho teoricamente supérfluo. Foi um momento chave aquele em que finalmente ele comprou um video-cassete e finalmente pude escolher aquilo que queria assistir. O primeiro filme foi aquela catarse, até hoje lembro que o vi várias vezes, cada vez procurando elementos novos. A partir daí seguiu-se um turbilhão de novos filmes. Nessa época o que contava era a quantidade, parecia que queria tirar todos aqueles anos de dependência cinematográfica. Era figura cativa na locadora perto de minha casa, amigo de todos os funcionários, sabia até o seu horário de trabalho e eles, por sua vez, incentivavam meu gosto consumista, me empurrando tudo o que tinham direito. Nessa época passei a catalogar tudo aquilo que assistia. Primeiro apenas anotava o nome dos filmes, depois passei a dar notas para tudo que assistisse. Por fim, passei a fazer pequenas resenhas comentando aspectos essenciais de cada obra. Vejo que a evolução deste caderno seguiu um pouco a evolução do meu entedimento da importância do cinema. Primeiro para mim bastava aumentar o número de filmes que tinha anotado, depois passei a preferir que todas as resenhas que fizessem fossem de filmes que realmente tinham algo a dizer. Junto com esse maior cuidado nas minhas anotações crescia em mim um filtro que trocava toda aquela quantidade por uma certa referência do bom e ruim, de quais filmes que realmente me tocam e quais aqueles que vejo só para passar o tempo. Então a quantidade foi se reduzindo e sendo substituída por um pedantismo escondido na busca incessante pela qualidade cinematográfica. Foi nessa fase que passei a consumir vários clássicos: Buñuel, Fellini, Billy Wilder, Woody Allen e Bergman. Mesmo com pouca idade, metia-me a tentar entender filmes muito complexos. Pura bobagem de adolescente tentando se firmar, até hoje talvez não tenha entendido a complexidade e a importância de tais cineastas.
Então finalmente comecei a ganhar meu próprio dinheiro. Não mais dependia de boa vontade paterna para saciar minha sede de cinema. Agora tinha meios de bancar meu gosto por filmes mas tinha que dividir meu tempo mais escasso. Acaba um pouco a fase do adolescente pseudo-intelectual e começa-se a reconhecer um pouco o porquê da magia do cinema. A quantidade já não era mais importante, a qualidade era mais do que necessária, mas não me exigia mais um conhecimento da complexidade das coisas que exigia anteriormente. Consumia o cinema tanto como divertimento como meio de engrandecimento.
Logo surge outra novidade, o DVD. Finalmente poderia ver meus filmes favoritos numa qualidade de imagem compatível com a qualidade do que está sendo mostrado. Mas quando finalmente tenho a oportunidade de ver renovado meu gosto cinematográfico também vejo meu tempo se esvaindo cada vez mais. Trabalho no interior, estudo pela noite, muito cansaço. Então nessa fase diminuiu-se muito a frequência com que me rendia aos encantos da sétima arte. Não conseguia mais dar conta de tudo que queria ver. Ficava por vezes frustrado de ver que quando finalmente eu tinha condições de sustentar meus gostos, não conseguia achar tempo para isso. Meu vício continua vivo, talvez estacionado em alguma parte do cérebro, esperando o tempo de poder reavivá-lo de forma plena. Alimento sempre que posso minha coleção de DVDs na esperança de que um dia saiba administrar meu escasso tempo para poder dar conta de tudo que me dá prazer.

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