quinta-feira, 21 de maio de 2009

Morena dos Olhos D'Agua

Julho de 2006. Passeava tranquilamente pelas ruas do Rio de Janeiro, quando, não sei bem o porquê, me chamou a atenção um cartaz pequeno em uma lojinha do bairro do Botafogo. Cheguei mais perto dele e qual foi a minha surpresa ao ver do que se tratava. Show com a Mônica Salmaso, minha cantora favorita, naquele mesmo dia. Olhei no relógio, já eram 5 da tarde e o show seria às 8 da noite. Peguei todas as informações sobre o mesmo e saí correndo para a casa da minha tia. No caminho vim pensando, o lugar onde vai rolar o show é meio estranho, pouco conhecido por mim, talvez fosse melhor chamar alguém para me acompanhar. Cheguei à casa de minha tia correndo, mandei mensagem para uma amiga minha que também é fã da Mônica, deixando-a com uma tremenda inveja com a minha sorte. Resolvi chamar alguém para me acompanhar ao show mas, como era esperado, as reações não foram muito positivas. “Mônica quem? Nunca ouvi falar! Toca o que?”. Eu, com toda a paciência, passava todas as informações necessárias. Era uma cantora que surgiu em São Paulo e que era pouco conhecida do público por ser extremamente exigente com o repertório que canta e por tentar fugir um pouco do clichê de cantora brasileira, escapando das músicas básicas e trabalhando num campo mais, como dizer, alternativo. Também explicava que o show seria apenas voz e acordeom. Nessa hora o desinteresse era evidente. “É forró? Mas não tem nenhum instrumento a mais? Putz, deve ser chato que só.” Desisti de tentar arrumar companhia para tal empreitada e corri para a estação mais próxima de metrô.
A ansiedade era tamanha que saí mais de uma hora antes do show começar. O local do show era o Teatro Rival, que fica na Cinelândia, área muito famosa do Rio antigo mas que agora encontra-se um pouco esquecida pela população. Achava que era uma área meio deserta pela noite, já que nunca tinha andado por ali nesse horário. Qual não foi minha surpresa ao chegar na Cinelândia e percebê-la toda iluminada, com barzinhos lotados de pessoas que saíam do trabalho e sentavam ali para conversar um pouco, tomar um chopp e esquecer dos problemas da vida moderna pelo menos por uns momentos. Perguntei onde era o Teatro Rival e a mulher me apontou um beco que fica por trás do Bar Amarelinho. Gelei um pouco mas mesmo assim não podia desistir estando tão perto. Cheguei no beco e avistei o Teatro Rival. Sempre tive uma idéia de opulência do lugar mas quando dele me aproximei vi que era um teatro bem acanhadinho, que vivia mais da fama antiga do que exatamente da sua qualidade. Ao comprar os ingressos fui informado pela mulher da bilheteria que não teriam ingressos individuais, teria que me sentar à mesa com mais três desconhecidos. Eu, na minha timidez reinante, recuei um pouco, mas a vontade de ver a Mônica tão de perto me fez esquecer desse problema clássico com o qual sempre tive que conviver. Entrei no teatro e fui levado à minha mesa. Sentei sozinho pensando que assim iria continuar pois achava que pouca gente conhecia a cantora e que com certeza o teatro não iria chegar nem perto de lotar. Mais uma vez estava enganado. O lugar ficou cheio de pessoas e, claro, três outras pessoas sentaram ao meu lado para assistir o show. E o pior para o tímido, as três se conheciam, então fiquei totalmente um peixe fora d’água. O barulho do local era terrível, as pessoas conversavam ao mesmo tempo e parece que acústica não ajudava o som a escapar. Mas o silêncio que se fez a partir do momento que as luzes foram apagadas foi impressionante. Finalmente a cantora que me fez ter outra visão da importância da música estava ali na minha frente com seu jeito tímido, educado e logo agradecendo a todos pela presença, impressionada, como eu, com a lotação do local, já que os shows dela se baseavam principalmente em São Paulo e não havia muita divulgação para os seus discos, normalmente gravados por pequenos selos. Ao primeiro som de sua voz dos deuses, os aplausos forem estridentes e extremamente sinceros. Eu ficava boquiaberto com tamanha potência de voz. Geralmente as pessoas de voz grave forçam por demais para cantar, você chega a ver as veias saltarem no pescoço. Para ela tudo parecia tão simples, não havia esforço nenhum ao cantar, as notas saíam limpas, fazendo a arte de cantar parecer algo tão simples aos olhos dos leigos como eu. O acordeom era um show a parte. Eu sempre achei um instrumento tão difícil de tocar, pois exigia uma coordenação motora que era coisa de outro mundo para mim, mas trouxe para o show um toque exótico que combinou totalmente com o ambiente que se criou. A interação entre os dois era perfeita. O público reconhecia isso e nem se perguntava pelo resto da banda. Apenas contemplavam estáticos e maravilhados tal momento sublime. O final de cada música era uma catarse. Todo o silêncio que imperava durante as músicas era esquecido durante instantes para homenagear aquele momento. Eu permanecia calado, atento a cada detalhe, tentando perceber cada nuance daquele espetáculo. Meu contato com as outras pessoas era o mínimo, apenas comentários esparsos sobre a excelência do show. Ria muito também de uma pessoa na platéia que ao final de cada música gritava feito um louco: “Canta muito essa mulher!!”. Eu concordava plenamente com aquele afoito rapaz, mas claro nunca teria coragem de pagar esse mico que ele se dispôs a pagar. Levei minha máquina para registrar esse momento mas a produtora do show pediu para que ninguém tirasse fotos para não atrapalhar a apresentação. Respeitei as orientações dela até o meio do show, quando observei que ninguém além de mim estava fazendo o mesmo. Tirei a máquina do bolso e pus-me a registrar para sempre aquele momento único. Como estava distante, as imagens saíam terríveis, mas até hoje mostro a todos com o maior orgulho a prova de que participei de tal momento.
O show foi até curto, no máximo uma hora e meia, mas coloco entre os momentos chave de minha vida, aquele momento em que separamos nossa paixão pela música de algo nada maior do que um entretenimento banal para algo que realmente nos marca como seres humanos, que define momentos de nossa vida, servindo como trilha sonora para todo o sempre. Vi outro show da Mônica aqui em Aracaju dois anos depois mas não chega perto daquele momento único e sublime que presenciei. Apenas serviu para que eu compartilhasse das mesmas emoções que passei com meus amigos, que estavam ao meu lado nesta segunda oportunidade. Ao final do show, pudemos comentar em uníssono: “Canta muito essa mulher!”

5 comentários:

  1. Coincidência ou não, tava ouvindo Mônica por esses dias... =)

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  2. Ótimos os textos. Em sua homenagem, vou procurar algo da Mônica para ouvir :)

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. maravilha de texto.
    =)
    convence qqr um a 'downloadeá-la' =]

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